Lidia

“Lídia, quando menina, gostava de se sentar à beira do Tejo  para

ver os peixes esquivos. Dia após dia, neles via sempre a mesma

vida,  o  mesmo  desassossego,  como  se,  para  eles, repetir  o

movimento fosse uma espécie de estilo. Isso a surpreendia. Por

que os peixes não era dado o fastio? – perguntava-se em sigilo.

Lídia, que ainda sente por eles um certo fascínio, hoje, longe do

Tejo,   responderia   a   isso  dizendo  que  as  coisas,   por  mais

repetíveis,  contêm,  todas  elas,  um  rio  –   subterrâneo  ou  de

superfície.  Ou seria um ritmo?  Mas  seja  o  que for, é isso que

garante  ao mesmo  uma dose de  imprevisto. Ou  de viço.  Aliás,

toda a história de Lídia se resume de certa forma neste mínimo:

por  mais  que ela busque  a  ordem  dos  peixes,  algo  a  desvia.”

Maria Esther Maciel

Manuseio

Tépidas
essas mãos
que divagam
devagar
por meus relevos
óbvios
e demoram
fundo
no obscuro
ponto
onde o corpo
se abisma
e silencia,
absurdo.

Maria Esther Maciel

http://www.letras.ufmg.br/esthermaciel/