“Lídia, quando menina, gostava de se sentar à beira do Tejo para
ver os peixes esquivos. Dia após dia, neles via sempre a mesma
vida, o mesmo desassossego, como se, para eles, repetir o
movimento fosse uma espécie de estilo. Isso a surpreendia. Por
que os peixes não era dado o fastio? – perguntava-se em sigilo.
Lídia, que ainda sente por eles um certo fascínio, hoje, longe do
Tejo, responderia a isso dizendo que as coisas, por mais
repetíveis, contêm, todas elas, um rio – subterrâneo ou de
superfície. Ou seria um ritmo? Mas seja o que for, é isso que
garante ao mesmo uma dose de imprevisto. Ou de viço. Aliás,
toda a história de Lídia se resume de certa forma neste mínimo:
por mais que ela busque a ordem dos peixes, algo a desvia.”
Maria Esther Maciel